A tragédia humana em Myanmar

quarta-feira, junho 18, 2014

Vítimas do extremismo budista, 150 mil muçulmanos vivem em campos de refugiados no país. Não têm acesso a medicamentos e alimentação adequada. Segundo a ONU, Myanmar assiste à execução de um crime contra a humanidade

Em um campo de refugiados em Sittwe, Rosheda,de 20 anos, segura seu filho de dois meses, que sofre de desnutrição.Sem dinheiro para comprar mantimentos, a criança deve morrer. É o destino de muitas das crianças vivendo nos campos de refugiados em Myanmar (Foto: Andre Malerba/Getty Images)

Em um campo de refugiados em Sittwe, Rosheda,de 20 anos, segura seu filho de dois meses, que sofre de desnutrição.Sem dinheiro para comprar mantimentos, a criança deve morrer. É o destino de muitas das crianças vivendo nos campos de refugiados em Myanmar (Foto: Andre Malerba/Getty Images)

“Só na morte ele será livre”. Mohhamad Johar tinha dois anos quando morreu. Confinada em um campo de refugiados no oeste de Myanmar, sua família fugiu de casa dias depois de ele nascer, deixando corpos pelo caminho. A família de Johar faz parte dos Rohingya, uma minoria muçulmana que, vivendo em Myanmar, sofre violenta perseguição. Há cerca de 1,4 milhão de Rohigya vivendo no país há gerações. O governo lhes nega cidadania e acesso a direitos básicos. Afirma que são, na verdade, imigrantes ilegais vindos de Bangladesh. Desde meados de 2012, o acirramento da violência contra os Rohingya tem forçado famílias inteiras a deixar para trás casa e familiares para procurar abrigo nos cerca de nove campos de refugiados criados na costa ocidental do país e em outras instalações em Bangladesh. As condições de vida sub-humanas em que vivem em Myanmar fez a ONU definir essas instalações como um “crime contra a humanidade”.

A revista Time acompanhou o funeral de Mohhamad Johar e o cotidiano de outras famílias moradoras do campo de Dar Paing, na cidade litorânea de Sittwe . Lá, sem acesso a serviços básicos de saúde, Mohhamad morreu de diarreia. “Só na morte ele será livre”, afirmou o irmão de 18 anos, durante a cerimônia.

Os Rohighya compõem 4% de uma população de maioria budista em um país que se esforça para se democratizar. Ao longo dos anos, muitos tiveram de buscar abrigo em campos de refugiados em Bangladesh.

Entre 1991 e 1992, cerca de 250 mil pessoas fugiram para o país. Segundo o Departamento de Estados dos Estados Unidos, há cerca de 150 mil refugiados morando nos nove campos em Myanmar. Teoricamente, os campos foram criados pelo governo para proteger uma população que sofre perseguição.

Ku Sumakahtu e seu bebê de 15 dias de vida. A criança começa a sofre de desnutrição (Foto: Andre Malerba/Getty Images)

Ku Sumakahtu e seu bebê de 15 dias de vida. A criança começa a sofre de desnutrição (Foto: Andre Malerba/Getty Images)

Sua situação piorou em 2012, quando entraram  em conflito com budistas extremistas. As tensões são inflamadas pelas palavras de ordem do monge Wirathu. Líder da facção budista 969, ele chama a si mesmo de “Osama Bin Laden budista”. Defende que os budistas devem deter a população muçulmana minoritária do país para que seu número não cresça. Desde 2012, comanda um boicote a  estabelecimentos mantidos por muçulmanos e defende a aprovação de uma lei que torne ilegal seu casamento com mulheres budistas. Sua pregação é apontada como o gatilho para os atos de violência contra os muçulmanos, que deixaram 250 pessoas feridas e fizeram algumas centenas de milhares migrar em 2013.

Uma mulher, incapaz de se levantar, espera por ajuda no campo de Thet Kae Pyin (Foto: Andre Malerba/Getty Images)

Uma mulher, incapaz de se levantar, espera por ajuda no campo de Thet Kae Pyin (Foto: Andre Malerba/Getty Images)

No começo de 2014, novos ataques de budistas fizeram as organizações de ajuda humanitária, que prestavam assistência aos refugiados Rohigya, deixar o país. Desde então, o governo proíbe seu retorno. Segundo reportagem da Al Jazeera, a saída dos grupos humanitários aumentou os riscos existentes sobre a população de 150 mil pessoas que vivem nos campos de refugiados e sobre outras 700 mil vivendo em vilas isoladas pela região. O Wolrd Food Program continua a fornecer rações de arroz, sal e óleo. Mas a quantidade de mantimentos não é suficiente para evitar casos de desnutrição. Não há médicos ou remédios suficientes para todos. Segundo refugiados disseram a Time, autoridades policiais de Myanmar os impedem, à pauladas, de pescar para complementar sua dieta.

Organizações de ajuda humanitária, como os Médicos sem Fronteira, foram proibidas pelo governo de atuar na região. Na sua ausência, os poucos médicos Rohingya tornam-se a única alternativa para a população (Foto: Andre Malerba/Getty Images)

Organizações de ajuda humanitária, como os Médicos sem Fronteira, foram proibidas pelo governo de atuar na região. Na sua ausência, os poucos médicos Rohingya tornam-se a única alternativa para a população (Foto: Andre Malerba/Getty Images)

Em desespero, muito se arriscam numa travessia de barco para a Tailândia. A viagem é feita com a ajuda de traficantes de pessoas, a quem os refugiados devem pagar US$ 2 mil, uma vez completada a travessia. Muitos deles vendem os próprios mantimentos, sucata e as próprias roupas na esperança de conseguir dinheiro para fazer a viagem.

Mães e filhos aguardam do lado de fora de um posto médico no campo de Thet Kae Pyin . Não há remédios para todos (Foto: Andre Malerba/Getty Images)

Mães e filhos aguardam do lado de fora de um posto médico no campo de Thet Kae Pyin . Não há remédios para todos (Foto: Andre Malerba/Getty Images)

Segundo o relatório do enviado da ONU Tomás Ojea Quintana, divulgado em abril, a carência de alimentos e remédios faz parte de mais uma etapa da perseguição étnica que essa população sofre historicamente. Para ele, é possível classificar as condições em que vivem como “um crime contra a humanidade”.

RC

Fonte: Época

 

 


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